O Futuro do Futuro

Robô com três braços faz história em Portugal no transplante de um fígado: “O robô é melhor do que nós”, afirma médico que liderou operação

Hugo Pinto Marques, diretor do Serviço de Cirurgia Geral e Transplantação da Unidade Local de Saúde de São José, explica que não serão os robôs a resolver o problema das listas de espera de cirurgias nos hospitais, mas vão dar um grande apoio aos médicos e devem ser “democratizado nos hospitais”: "Em Espanha há um por cada 350 mil habitantes, na Suíça um por cada 213 mil habitantes, e em Portugal temos um robô por cada milhão de habitantes.” Oiça aqui a entrevista no podcast O Futuro do Futuro

No dia 5 de fevereiro, Hugo Pinto Marques registou o nome para a posteridade como líder da equipa de cirurgia do Hospital Curry Cabral, em Lisboa, que realizou pela segunda vez na história da medicina um transplante de um fígado inteiro com a ajuda de um robô. A cirurgia apresentou vantagens notórias em termos de recuperação para o doente, mas o cirurgião do Curry Cabral também admite que há benefícios para quem faz a operação.

“Somos muito treinados e obviamente fazemos aquilo com grande precisão, mas o robô é melhor que nós”, responde Hugo Pinto Marques, diretor do Serviço de Cirurgia Geral e Transplantação da Unidade Local de Saúde de São José, que abrange vários hospitais lisboetas.

Antes da cirurgia de 5 de fevereiro apenas um hospital em Saint Louis, nos Estados Unidos, tinha conseguido levar a cabo um transplante de um fígado inteiro com a ajuda de robôs. Em vez de uma incisão que vai do centro do abdómen até às costas, a equipa do Curry Cabral apenas teve de realizar uma incisão com um máximo de 10 centímetros – e essa diferença revela-se essencial para a recuperação do paciente, uma vez que há menos tecidos e órgãos afetados pelos diferentes procedimentos cirúrgicos.

Hugo Pinto Marques, cirurgião no Curry Cabral, considera que os robôs devem ser democratizados pelos hospitais do País
Matilde Fieschi

O doente, de 51 anos, precisava de um transplante de fígado devido a uma cirrose – e teve alta hospitalar passados 11 dias, em vez das duas semanas que costumam ser necessárias para se sair do hospital depois de um transplante de fígado.

A operação contou com a ajuda de um robô com três braços que replicam os movimentos que um cirurgião de carne e osso vai realizando com manípulos enquanto observa o interior do doente a partir de imagens captadas pelo autómato que se encontra a alguns metros de distância. “Vemos uma ampliação que chega até 10 vezes”, começa por dizer Hugo Pinto Marques, fazendo comparação com as lupas hoje disponibilizadas para as cirurgias convencionais, sem robô, que garantem uma ampliação de cinco vezes.

Além de câmaras que garantem “capacidade de ver em ângulos que seria impossível vermos quando estamos a fazer uma cirurgia por via convencional”, o robô permite executar movimentos e ações no interior do corpo que um cirurgião pode ter dificuldade em executar.

Para dar a conhecer a cirurgia de 5 de fevereiro, Hugo Pinto Marques trouxe um vídeo produzido pelo Hospital Curry Cabral, que pode ser visualizado nesta página.

“Imagine a precisão de fazer, por exemplo, uma ligação entre duas veias ou duas artérias, a olhar para elas com 10 vezes a ampliação sem nenhum tipo de tremor ou nenhuma imprecisão do gesto”, refere o cirurgião do Curry Cabral, numa descrição sobre as principais vantagens de ter um robô a executar os diferentes procedimentos cirúrgicos. “Percebemos, pelo movimento dos tecidos à volta daqueles em que estamos a manipular, a força que estamos a fazer”, acrescenta o cirurgião sobre os dados que obtém a partir dos manípulos do robô enquanto está a operar.

Hugo Pinto Marques considera que não serão os robôs a resolver os tempos de espera para as urgências do Serviço Nacional de Saúde, mas considera que é chegada a hora de alargar o raio de ação dos autómatos. Até porque os números revelam que Portugal, com um robô cirúrgico para cada milhão de habitantes mantém-se atrás de referências como Espanha com um robô por 350 mil habitantes ou Suíça com um robô por 213 mil habitantes.

“Obviamente o robô tem que ser democratizado. O robô não deve ser colocado apenas em grandes hospitais de ponta só para fazer cirurgias complicadas. Eu acho que, inclusivamente, hospitais do interior do país têm que ter acesso a robôs”, refere.

Sobre as listas de espera das cirurgias, Hugo Pinto Marques recorda que os robôs de hoje limitam-se a executar, em salas de operações, os gestos dos cirurgiões. O que significa que são os conhecimentos do humano que permitem levar a cabo a cirurgia.

O cirurgião admite que, caso surjam robôs que executam de forma autónoma, com inteligência artificial, as cirurgias que lhe são solicitadas, todo o processo poderá ficar mais expedito. Mas também lembra que esse cenário ainda vai demorar a tornar-se uma realidade.

Hugo Séneca conversa com mentes brilhantes de diversas áreas sobre o admirável mundo novo que a tecnologia nos reserva. Uma janela aberta para as grandes inovações destes e dos próximos tempos

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