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“Temos de fazer um tratado de Tordesilhas para a Lua? Dividi-la em fatias entre EUA e China? É complicado”

O presidente da Agência Espacial Portuguesa admite que o futuro Porto Espacial de Santa Maria receba as primeiras “reentradas” de missões espaciais ainda em 2024, mas aponta as primeiras descolagens para 2025. O Porto Espacial da ilha açoriana vai ser explorado por uma entidade comercial, garante Ricardo Conde no podcast Futuro do Futuro. Sobre a crescente militarização do Espaço, diz que já se nota na gestão de órbitas. Oiça aqui a entrevista

Ricardo Conde, presidente da Agência Espacial Portuguesa, pretende anunciar a entidade que vai explorar o futuro Porto Espacial de Santa Maria entre "abril e maio"
Nuno Fox

A contagem decrescente para o regresso à Lua já se faz sentir algures entre Washington e Pequim - e à medida que avança há uma questão que se impõe: afinal, quem é o dono do satélite natural da Terra? “Então temos que fazer um tratado de Tordesilhas para a Lua? Será que passa por aí? Vamos dividir a lua entre fatias? Isto é meu, aquilo é teu. Isto é complicado”, responde Ricardo Conde, presidente da Agência Espacial Portuguesa, em entrevista ao podcast Futuro do Futuro.

Estados Unidos e China preveem regressar à Lua com missões tripuladas antes de 2030, e esses projetos não só pressupõem um acréscimo de tráfego, como levantam questões sobre a necessidade de policiamento. “Isso é o grande elefante na sala, que é a militarização do espaço e a conquista do espaço”, confirma Ricardo Conde, admitindo o potencial de atritos em órbita.

Numa entrevista que atravessa atualidade aeroespacial, Ricardo Conde confirma que, depois de uma primeira “descolagem” fracassada, o Porto Espacial da ilha de Santa Maria prepara-se agora para nova contagem decrescente no que toca à escolha da entidade que deverá gerir a futura base de lançamento de pequenas missões espaciais nos Açores.

Estima que o anúncio da escolha final sobre a exploração do futuro Porto Espacial seja anunciada “em abril ou maio” e que ela deverá recair sobre “uma empresa ou uma entidade puramente comercial” e não haverá parcerias público-privadas.

Ricardo Conde, presidente da Agência Espacial Portuguesa, informa que a Constelação Atlântica deverá alargar-se ao Reino Unido e Grécia, e está a ser trabalhada o alargamento a Angola
Nuno Fox

“Não é um concurso. O que vamos ter é um período em que vamos receber propostas de interesse”, esclarece o presidente da Agência Espacial Portuguesa.

Segundo Ricardo Conde, esse período de recolha de demonstrações de interesse deverá arrancar em fevereiro. O futuro Porto Espacial não deverá acolher qualquer descolagem em 2024, mas também é possível que venha a assistir, ainda este ano, às duas primeiras “reentradas”, com a aterragem de veículos espaciais no aeroporto ou com amaragens, nas imediações da pequena ilha açoriana.

Se tudo correr como previsto, a ilha de Santa Maria poderá ser escolhida para o lançamento do veículo espacial Space Rider, que é um dos projetos mais emblemáticos da Agência Espacial Europeia.

Quanto ao impacto que motivou resistência de parte da população da ilha açoriana, Ricardo Conde considera que se trata de “um mito” e sublinha que as emissões poluentes de missões espaciais de pequenas dimensões são apenas uma fração das emissões que já se regista em aterragens e descolagens no aeroporto local.

A Agência Espacial Portuguesa foi lançada em 2019 – mas na verdade não é a primeira iniciativa do género. Ricardo Conde recorda a primeira tentativa de constituição da “Portugal Space SA” entre 2000 e 2002 que haveria de ser abandonada por decisão política. E a este dado junta-se o facto de o PoSAT-1, que é o primeiro satélite de bandeira portuguesa, ter sido descontinuado bem antes de ser lançado um sucessor, que só deverá descolar para o espaço a 1 de março, com a denominação de Aeros.

“Assim como houve pessoas com responsabilidade política para olhar com um pensamento estratégico sobre esta área em particular, também houve os que não tiveram e ignoraram”, responde o presidente da Agência Espacial Portuguesa.

Em resposta aos desafios que geralmente são colocados aos entrevistados do Futuro do Futuro, Ricardo Conde trouxe o livro “Crescimento Zero”, de Alfred Sauvy, e o tema musical “The Great Gig in the Sky”, dos Pink Floyd.

Capa do livro "Crescimento Zero", de Alfred Sauvy, que Ricardo Conde escolheu para um dos desafios do Futuro do Futuro

Depois de um hiato de 30 anos, que Ricardo Conde considera ter sido demasiado longo, perfilam-se oito os lançamentos de bandeira portuguesa até 2026. O presidente da Agência Espacial Portuguesa admite que nem todos consigam realmente vir a descolar, mas também lembra que o fracasso faz parte do processo – e revela-se valioso pelos ensinamentos produzidos, que permitem a venda de tecnologias, mesmo quando os projetos não chegam a sair de terra-firme.

A mesma lógica de avanços e recuos é aplicada na forma como encara a exploração de Marte que, ao contrário daquilo que preveem os planos americanos e chinês, é enquadrada em horizontes de “100 ou 150 anos”, refere o presidente da Agência Espacial Portuguesa.

Hugo Séneca conversa com mentes brilhantes de diversas áreas sobre o admirável mundo novo que a tecnologia nos reserva. Uma janela aberta para as grandes inovações destes e dos próximos tempos

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