Ser ou Não Ser

Tiago Pitta e Cunha: “No Mediterrâneo, a temperatura média da água, durante o verão, rondou os 28,4ºC. Um dia os oceanos vão explodir”

O aquecimento global é o tema das cimeiras do clima, mas o oceano, que retém 90% desse calor, nunca conseguiu ter palco. Tiago Pitta e Cunha alerta que o oceano já quase não consegue armazenar essa energia “louca”. Se nada for feito “a bomba” pode explodir. Oiça a conversa com o CEO da Fundação Oceano Azul, no podcast Ser ou Não Ser

“Portugal tem a maior zona económica exclusiva da União Europeia.” Esta frase, dita por um professor de direito do mar, quando Tiago Pitta e Cunha estudava em Inglaterra, marcaria o seu percurso profissional. A partir desse momento a sua carreira seria dedicada à política dos oceanos. Para o CEO da Fundação Oceano Azul, o mar é o que verdadeiramente nos diferencia. “Somos um país avassaladoramente marítimo em termos geográficos. Uma situação geográfica como esta na Europa é única.”

Apesar da importância do mar para o planeta, o CEO da Fundação Oceano Azul lamenta que este ainda não esteja na agenda das COPs do clima. “Os oceanos são a apólice de seguro de vida do planeta porque têm a capacidade de esconder os impactos das alterações climáticas.” Na sua opinião, tem-se varrido a “poeira” para debaixo do tapete. “Se não fosse o oceano absorver mais de 90% do excesso de calor gerado pelo aquecimento global teríamos, segundo os modelos científicos mais conservadores, mais 17 graus celsius na atmosfera.”

Matilde Fieschi

Em 2015, no Acordo de Paris, não se falou de os oceanos absorverem 90% do excesso de calor. Na COP 28, realizada no Dubai, pouca coisa mudou. Os oceanos continuam a ser o parente pobre das alterações climáticas. O problema é que na opinião de Tiago Pitta e Cunha estes começam a apresentar sintomas de saturação. “Já não conseguem armazenar essa energia ‘louca’ e um dia vão explodir, aliás, já começam a dar sinais. Veja-se o que sucedeu este ano no Mediterrâneo, em que a temperatura média da água, durante o verão, rondou os 28,4 graus ou o que aconteceu na Líbia, com chuvas a provocarem a morte de 20 mil pessoas.”

Para Tiago Pitta e Cunha este será o século da descarbonização, mas lamenta que se continue a desenvolver atividades económicas altamente extrativas, principalmente quando o argumento utilizado é que para termos baterias são necessários minérios que estão no fundo do mar. “Estamos esperançosos que haja uma coligação de 24 países que se manifestou contrária a iniciar qualquer exploração submarina de minerais no fundo do mar até, pelo menos, a ciência e a tecnologia controlarem o real impacto que esta terá no sistema.”

Matilde Fieschi

“A única boa notícia para oceanos neste século foi a assinatura do Tratado do Alto Mar para a proteção dos oceanos”, elogia o responsável da Fundação Oceano Azul. Uma decisão histórica que levou mais de 20 anos a ser concretizada e que envolve mais de 80 Estados Membros das Nações Unidas (ONU). Este tratado é fundamental para proteger os oceanos, combater a degradação ambiental e as alterações climáticas e prevenir a perda de biodiversidade no alto mar. “Quando entrar em vigor, podemos passar a criar áreas marinhas protegidas no Alto Mar, e isso é uma grande mudança.”

Por falar em áreas marinhas protegidas, Portugal tem cerca de 70, contudo “muitas não têm planos de gestão, não são monitorizadas, nem fiscalizadas. Estão apenas no papel”, explica. A Fundação Oceano Azul está a trabalhar nesta temática, nomeadamente na Madeira, nos Açores e no Algarve, entre outras zonas do país. No caso do Algarve, a Fundação Oceano Azul fez um estudo com a Universidade do Algarve e os resultados não foram animadores. “Nos últimos 30 anos, o Algarve perdeu 60% dos seus recursos piscícolas. Isto mostra como podemos estar numa vertigem para o fundo”, diz Tiago Pitta e Cunha, salientando, no entanto, que o importante é não estragar mais e restaurar o que resta. Em todo o país.

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