Passaram quase duas semanas desde que o país foi a votos e mais de um milhão e 100 mil pessoas escolheu colocar a cruz num partido assumidamente racista, machista, xenófobo, homofóbico, transfóbico e antidemocrata. Como se explica este fenómeno, que não é só nacional, como mundial? Neste episódio em podcast começamos por analisar os vários caminhos que levaram a este resultado.
Portugal foi dos últimos países europeus a ter uma expressiva bancada parlamentar da direita radical, mas o fenómeno extremista chegou finalmente ao nosso país. E tem crescido de forma galopante. Em apenas 5 anos o Chega passou de 1 deputado para 12 e agora para 50. Como se explica que um partido que aposta no preconceito e na discriminação de grupos sociais ganhe cada vez mais adeptos em Portugal?
Desde o resultado das legislativas, muitas têm sido as vozes a dizer que não é crível que tantas pessoas sejam racistas, machistas, xenófobas, homofóbicas, transfóbicas, ou antidemocráticas. E que estes 50 deputados eleitos pelo Chega foram votos de puro descontentamento e indignação. Por zanga. Por birra. Por serem do contra. Mas só isto não explica o resultado.
Se de facto um certo descontentamento com o desempenho dos governantes fez com que mais pessoas se sentissem seduzidas por um projeto político extremista e securitário, a prometer limpar o país dos corruptos - apesar de conter ele próprio inúmeros dirigentes condenados por corrupção - também muita gente se sentiu ouvida e legitimada quando um líder partidário subiu ao palanque para apontar certos grupos sociais como inimigos e ameaças, com base em mentiras, frustrações, raivas e medos. Quais os riscos da normalização cada vez maior do preconceito e do ódio?
Como é que 50 anos depois da conquista da nossa democracia um partido antidemocrata começa a agigantar-se na Assembleia com 50 deputados e disposto a usar a democracia para rebentar com ela e colocar minorias sociais como bodes expiatórios e alvos de todos os males? O que faz com que haja cada vez mais pessoas interessadas em votar na extrema-direita? O que isto diz de nós, da nossa democracia e do nosso país? Como se explica que não gostemos de certos grupos sociais à partida, sem os conhecermos bem? Onde se enraízam os preconceitos e o que os faz crescer?
Estas questões são colocadas a Rui Costa Lopes que anda há muito a estudar estes temas. Doutorado em Psicologia Social pelo ISCTE e investigador Principal no ICS dedica-se ao estudo das relações intergrupais, preconceito e discriminação. O seu último livro, lançado em janeiro deste ano, é um ensaio sobre isto mesmo, “Preconceito e discriminação em Portugal”, uma edição da Fundação Francisco Manuel dos Santos. E com esta sucessão de acontecimentos torna-se ainda mais pertinente e urgente a sua leitura para nos ajudar a perceber a origem deste problema social e político.
Neste podcast ficamos a saber que Portugal tem das maiores percentagens de inquiridos com crenças racistas e são recordadas as mortes recentes de Bruno Candé e de Giovanni Rodrigues e, esta semana, de Ademir Araújo Moreno, de origem cabo-verdiana assassinado na cidade da Horta, na ilha do Faial, por alegado “ódio racial”. O problema é sistémico e as próprias forças policiais têm sido acusadas de discriminação e crimes racistas. De onde vem tanto ódio?
Qual o risco da normalização do preconceito e da discriminação? Arriscamo-nos a passar a ter uma sociedade massivamente preconceituosa e disposta a colocar no poder um partido extremista? O que pode inverter esse caminho? O que diz a psicologia social sobre isso? Rui Costa Lopes responde.
Nesta segunda parte do episódio, o investigador Rui Costa Lopes começa por responder às provocações e elogios do cientista político e amigo Pedro Magalhães, que lhe aponta o sentido de humor “implacável” do Rui. O que o faz rir? E como o humor pode ser uma boa arma para a empatia?
Rui fala da sua mudança recente para a ilha Terceira, nos Açores, e a epifania que o levou a dar-se conta que a sua felicidade estava nas coisas mais simples, deixando de lado o peso das grandes missões de vida. E aqui partilha os seus novos prazeres na ilha, a vontade de juntar uma cabra ao seu agregado familiar, uma breve leitura do livro “A Insustentável Leveza do Ser”, de Milan Kundera, que traduz esta sua nova fase e dá-nos a ouvir algumas das músicas que o acompanham.
Como sabem, o genérico é assinado por Márcia e conta com a colaboração de Tomara. Os retratos são da autoria de José Fernandes. E a sonoplastia deste podcast é de João Ribeiro.
Até para a semana e boas escutas!