Mais vale passar um dia com um bom professor do que estudar com afinco durante mil horas. A professora Cristina Duarte recorda o provérbio japonês quando a conversa é sobre o ensino em Portugal. Ela, como milhares de docentes que, nos anos 70 e 80 entraram para a Escola pública, está na fase de fazer contas à carreira contributiva e reformar-se.
Acontece que não quer. Como, não quer? Pergunta-se incrédula uma classe e a jornalista, que de outros colegas com a mesma idade só vê sorrisos quando se menciona o afastamento da profissão. De que fibra é feita esta professora, que em novembro faz 67 anos, para insistir, em 2023, em dar os Clássicos da Literatura a jovens do secundário, no Liceu Camões?
"Ainda não me sinto preparada para me despegar dos miúdos". E ao que parece, eles também não. Um vez por semana, Cristina Duarte continua a reunir atuais e antigos alunos para um recital de poesia na biblioteca do liceu.
O antigo Camões não foge à regra da escola pública nacional, a média etária anda acima dos 50 anos, mas a camaradagem, o ambiente festivo e a liberdade pedagógica trazem ainda muitos docentes agarrados ao ensino. A carreira está envelhecida, com poucos a serem seduzidos para a docência.
Em dez anos, de 2010 a 2020, a percentagem de docentes com mais de 50 anos passou de 27,1% para 51,9%. A subida é proporcional ao desinteresse manifestado pela carreira. A percentagem de professores com menos de 30 anos de idade desceu dos 7,4%, em 2010, para os 1,6%, em 2020, segundo dados do Conselho Nacional de Educação.
Houve mestrados que habilitam para o ensino que nem sequer abriram. Em 2019/20, dos 158 mestrados disponíveis nas universidades, escolas superiores e politécnicos, 23 nem começaram. Os alunos de 15 anos não mostram vontade de lecionar, dizem repetidamente os dados do PISA que, por sua vez, são mencionados nos relatórios do Conselho Nacional de Educação e transmitidos aos tutelares da pasta da Educação.
Quem quer ser professor?
Em 48 anos de democracia Portugal teve 25 ministros da Educação, seis deles no primeiro ano pós-revolução. Muitos não aqueceram o lugar nem deixaram memória. Era o tempo em que a democratização do ensino exigia muitos e novos professores.
Isabel Lima tinha 29 anos quando Roberto Carneiro, no governo de Cavaco Silva entre 1987 e 1991, deu ao professores o primeiro estatuto da carreira docente, a bíblia da profissão que, desde então, já conheceu 19 alterações. Nem todas deixaram boas recordações, com Maria de Lurdes Rodrigues e Nuno Crato na cabeça de muitos professores pelas piores razões.
João Costa, ministro de um governo maioritário, tem agora a missão de dar sangue novo ao ensino público. Quem Quer Ser Professor? É a pergunta que se coloca na Grande Reportagem.