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Experimentação animal a caminho do fim? Realidade está “longe”, mas o bem-estar já é “prioridade”

A diretiva europeia que regula a utilização de animais em contexto de experiências foi transposta para a lei portuguesa há 10 anos. Passou a haver um órgão dedicado ao bem-estar animal, que procura ativamente formas de substituir, reduzir e refinar os processos nos laboratórios. Mas a União Europeia quer mais: acabar de vez com a utilização de animais em experiências. Os investigadores acreditam que esse objetivo ainda está longe de alcançar.

Experimentação animal a caminho do fim? Realidade está “longe”, mas o bem-estar já é “prioridade”
Mafalda Gomes

A touca e a bata azul são as primeiras proteções que se colocam. Seguem-se os cobre-sapatos, que se aplicam no momento de atravessar a barreira sanitária. Do outro lado, o chão cola para impedir que potenciais fontes de contaminação possam, mesmo assim, passar. Agarra-se e coloca-se uma máscara, num par de luvas e, mesmo antes de entrar, borrifa-se as mãos com spray desinfetante. Do outro lado da porta há um corredor branco e estéril, que faz lembrar um hospital. No entanto, no interior dos quartos não há camas nem pacientes, mas gaiolas com murganhos e ratos.

A porta de uma dessas salas abre-se e o cheiro característico da comida e do carolo de milho emana no ar – um odor que quem trabalha diariamente com animais de laboratório já nem sente. Uma investigadora dirige-se a uma das estruturas com dezenas de gaiolas e retira uma.

Coloca-a numa estação de muda – um espaço protegido por barreiras de ar que impedem potenciais patógenos de contaminar os animais, muitas vezes imunocomprometidos. Um a um, os animais são colocados, cuidadosamente, numa câmara de anestesia para que possam adormecer antes de ser iniciado o procedimento. Depois, rapa-se o pelo e coloca-se o murganho num aparelho IVIS. No ecrã, aparece uma imagem do tumor que foi induzido no animal. Desta forma, a investigadora consegue analisar o crescimento do cancro sem causar stress ou sofrimento ao animal.

Investigadora realiza procedimentos num murganho, no biotério da Fundação Champalimaud
Mafalda Gomes

No biotério da Fundação Champalimaudexistem mais de 11.800 murganhos (conhecidos como ratinhos) e ratos – as duas espécies mais utilizadas para investigação em Portugal e na Europa. Nestas salas, os investigadores dedicam-se a estudar o cancro e as neurociências – duas áreas completamente diferentes no que às experiências diz respeito.

O espaço é enorme, quando comparado com o tamanho de cada um dos animais. Nas gaiolas, onde podem estar até cinco animais, há ninhos feitos de papel, pedaços de madeira e até um objeto vermelho que permite ao animal esconder-se. O enriquecimento ambiental tem como objetivo proporcionar uma vivência ao animal que seja o mais normal possível.

Os cuidados de bem-estar no contexto de laboratório são determinados pela diretiva europeia em 2010 (diretiva europeia 63/2010), transposta para a legislação portuguesa três anos depois (Decreto-Lei n.º 113/2013). No documento aprovado é várias vezes referida a necessidade de reduzir ao mínimo a utilização de animais, enquanto não se encontra uma alternativa que permita colocar um ponto final nos biotérios. Até lá, o bem-estar tornou-se uma prioridade para os investigadores e tratadores.

Prateleiras onde estão as várias gaiolas dos animais, com as informações referentes aos projetos em curso
Mafalda Gomes

A Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV), entidade reguladora do setor em Portugal, afirma que a lei tem como objetivo “assegurar que a utilização dos animais seja sempre humana, cuidada, responsável e justificada”. Este é o ponto base, mas os institutos procuram ir “para lá da lei”.

“No caso português, as instituições estiveram historicamente à frente das leis”, afirma Isabel Campos, diretora do biotério da Fundação Champalimaud, sublinhando que, passados dez anos, “as instituições ainda estão à frente da entidade competente”. “Mas já estivemos muito mais”, ressalva.

A diretora do biotério reconhece que a DGAV está a “fazer um caminho muito louvável”, tendo aumentado os recursos e apertado o escrutínio aos projetos e instituições que trabalham com animais. Nesse âmbito, a Champalimaud foi alvo de uma inspeção surpresa este ano.

Isabel Campos, diretora do biotério de roedores na Fundação Champalimaud
Mafalda Gomes
“Dez anos depois da lei eles fizeram a primeira inspeção surpresa. Foi fantástico porque existiu e porque correu muito bem – para nós e acho que para eles também. Estão a ficar mais competentes, não tarda podem ajudar-nos nas nossas dúvidas”, afirma Isabel Campos.

Para já, as instituições contam com a ajuda dos pareceres da Federação das Associações Europeias de Ciência e Animais de Laboratório (FELASA, na sigla inglesa) e da Associação Internacional para a Avaliação e Credenciação de Cuidados a Animais de Laboratório (AAALAI, na sigla inglesa). Estas organizações internacionais debatem e analisam as melhores práticas para diversas situações, processos e questões éticas. Os próprios institutos portugueses criaram uma rede para trocar ideias e opiniões sobre os procedimentos.

“A lei diz que temos de fazer, mas não diz como”, afirma Catarina Carvalho, médica veterinária no biotério da Fundação Champalimaud. Por isso, “os peritos que trabalham nisto há muito tempo juntam-se, debatem e chegam a acordo com a sua experiência”. Essas conclusões são depois adotadas pelos biotérios e transpostas para as práticas diárias.
As gaiolas dos murganhos e ratos são enriquecidas com objetos que tentam replicar o ambiente natural
Mafalda Gomes

Em Portugal, a DGAV aprovou a utilização de 77.835 animais para investigação, com os murganhos (ratinhos) a representar 71,5% das experiências. Os dados mais recentes são de 2021 e mostram uma diminuição do número de animais, quando comparado com o ano de 2012 – antes de entrar em vigor a lei em Portugal. Nesse ano, foram utilizados 81.124 animais para experimentação, dos quais 73,9% eram murganhos.

A diminuição do número de animais utilizados em experiências estará relacionada com a imposição de um maior controlo legislativo para a aprovação dos projetos. Quando apresentam o projeto para aprovação, os investigadores têm de justificar o uso de animais, reduzir o número ao mínimo possível e apresentar uma análise da relação dano-benefício. Segundo a DGAV, a investigação só será aprovada se o benefício for “grandemente” maior do que "os danos causados ao animal. Também o investimento das instituições na criação de uma cultura de cuidado tem tido impacto.


Os 3Rs e a preocupação pelo bem-estar dos animais

Três investigadores esperam à porta da sala de reuniões do biotério do Instituto de Medicina Molecular (iMM). Vêm para uma reunião com alguns elementos do Órgão Responsável pelo Bem-Estar e Ética Animal (ORBEA), um organismo autónomo criado pela diretiva europeia. A técnica de bem-estar e o médico veterinário entram na sala e sentam-se na mesa oval para discutir com o grupo de investigadores os procedimentos do projeto de investigação e como será acautelado o bem-estar dos animais.

Tratadora faz limpeza da gaiola no biotério do iMM
Mafalda Gomes

O ORBEA é um “órgão consultivo”, explica Iolanda Moreira, diretora do biotério de roedores do iMM. O principal contributo deste grupo é “aconselhar os investigadores sobre a melhor forma de chegarem à sua hipótese científica, salvaguardando sempre o bem-estar dos animais e, ao mesmo tempo, a relevância objetiva do que se propõem a fazer”.

Neste aconselhamento, o ORBEA oferece opções que possam reduzir o sofrimento dos animais perante determinado processo ou doença que lhe venha a ser induzida no contexto da experiência. São analisadas as técnicas descritas, procuradas opções que substituam o uso de ratinhos e calculado a relação dano-benefício da investigação.

Tentamos sempre que os animais recebam os cuidados adequados à espécie, ao projeto no qual estão envolvidos e à fase de vida em que se encontram. Tentamos analisar se um animal vai desenvolver espontaneamente ou se lhe vai ser induzida alguma doença no decurso de vida e como podemos melhorar os efeitos causados ao animal”, afirma a diretora do biotério de roedores.
Iolanda Moreira, diretora do biotério de roedores do iMM
Mafalda Gomes

E dá exemplos: “Para um animal artrítico, que sabemos que vai desenvolver inchaço dos membros posteriores, trocamos o tipo de cama e, em vez de colocar carolo de milho, colocamos aparas de papel, porque é menos abrasivo. Colocamos a comida no fundo da gaiola e tetinas mais compridas nos biberons, para garantir o acesso facilitado à água e ao alimento.

No interior do biotério do iMM, duas tratadoras estão a realizar as rondas de limpeza das gaiolas. Dentro da câmara de fluxo, para proteger o animal de agentes microorganismos indesejados, abrem a caixa e transferem os animais para uma caixa lavada e esterilizada, já com a cama de carolo de milho no fundo. Passam os elementos de enriquecimento ambiental, colocam mais comida na grelha e fecham a caixa. Mudam os bebedouros e devolvem a caixa à estrutura.

Para Daniel Costa, médico veterinário designado para o biotério do iMM e membro do ORBEA, os tratadores são a “primeira linha de observação e deteção de casos dentro do biotério”. Durante as rotinas de muda, os tratadores passam em revista todas as caixas do biotério para perceber se o animal está bem. Estão habituados aos sinais de sofrimento e seguem as indicações que são colocadas nas caixas como alerta – por exemplo, “Special Care” (cuidado especial, em português) ou “Veterinarian” (veterinário).

Uma gaiola de ratos com nota de "Veterinary" no biotério do iMM
Mafalda Gomes
“No biotério do iMM, sinto total liberdade para atuar em benefício dos animais sempre que haja alguma situação [que coloque em risco o] bem-estar animal, essa é a nossa prioridade, além da investigação em si”, garante o Daniel Costa, sublinhando que, “sempre que possível” se tenta “salvaguardar as duas”.

Também na Champalimaud, o “compromisso” entre o bem-estar e a investigação é o objetivo do ORBEA, assim como a realização de uma “ação pedagógica” junto dos investigadores, explica a médica veterinária Catarina Carvalho.

Os cuidados prestados pela equipa de veterinário no biotério são o equivalente aos “cuidados paliativos, esclarece Isabel Campos. “O animal está a passar por um processo de doença, porque esse é objetivo experimental. Precisamos disso para retirar os dados experimentais, mas vamos dar-lhe todo o conforto possível para que o impacto no seu bem-estar seja o mínimo possível”, acrescenta.

Se for detetada alguma situação irregular na execução dos procedimentos ou se se comprove que o investigador tenha realizado práticas que comprometem o bem-estar animal, ambos os institutos referem que é possível aplicar sanções internas, tais como retirar o acesso ao biotério e suspender o projeto de investigação em causa. Se o caso for muito grave, será reportado à entidade reguladora, que atuará em conformidade – podendo ser suspenso o projeto em cursou ou reconsiderada a licença atribuída.

A identificação das gaiolas tem todas as informações sobre o estudo, o investigador principal e os procedimentos
Mafalda Gomes

A preocupação com o bem-estar dos animais tem vindo a ser incutidas nos investigadores ao longo dos anos e os frutos já começam a surgir. “Temos notado uma maior preocupação por estas questões”, afirma a Márcia Silva, técnica de bem-estar animal no iMM, destacando o trabalho do ORBEA na promoção dessa consciencialização. “Tentamos fomentar essa cultura de cuidado a nível institucional. Notamos que é mais fácil incutir logo essa preocupação e esse cuidado quando recebemos investigadores novos.”

A diretiva europeia impõe a realização de formação para todos os investigadores que queiram realizar experiências em animais. Além do licenciamento da instituição e do projeto, a DGAV concede também licenças individuais aos investigadores. Esta formação é dada nos institutos, pelos membros do ORBEA.

Na Fundação Champalimaud também se nota que os investigadores saem das formações “com uma noção clara dos conceitos de bem-estar, substituição, redução e reutilização, das análises custo-benefício e das alternativas”. Catarina Carvalho também reconhece melhorias, mas refere que, em última instância, as preocupações “dependem da sensibilidade individual de cada um.

“Já houve fases em que se usava muito mais animais e havia muito desperdício. Acho que os investigadores estão cada vez mais sensibilizados para o número de animais utilizados, devido à pressão para reduzir e eliminar de todo as experiências com animais. Mas há investigadores que ainda tomam como garantida essa possibilidade”, afirma.
Os procedimentos são realizados nas estações de muda, para evitar contaminação
Mafalda Gomes

A redução é um dos pilares da política dos 3Rs – “replacement”, “reduction” e “refinement”, que em português se traduz por “substituição”, “redução” e “refinamento” –, na qual se baseia a diretiva europeia sobre a experimentação animal. Esta política foi criada pelos investigadores britânicos W.M.S. Russell e R.L. Burch, em 1958, com o objetivo de promover o bem-estar e reduzir o sofrimento.

A “substituição” promove a utilização de métodos não animais para a realização das experiências, sempre que possível. Se existir uma alternativa – por exemplo linhas celulares, modelos de computador, modelos químicos, organoides ou micro-organismos –, a utilização de animais não deve ser aprovada. A “redução” passa pela promoção de métodos que minimizem a quantidade de animais utilizadas para obter a informação necessária. Por fim, o “refinamento” dedica-se à melhoria dos procedimentos científicos para que se reduza ao mínimo a dor, o sofrimento, a angústia ou os danos no animal.

O bem-estar dos animais é uma prioridade do ORBEA, que apoia os investigador a realizar procedimentos menos dolosos
Mafalda Gomes

Com base nestes princípios, foi criado em Portugal, em abril de 2023, o 3Rs Knowledge Center (3RKC). Anna Olson, investigadora Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (I3S) e fundadora do organismo, explica que o objetivo é “disseminar e promover conhecimento e apoio aos investigadores que procurem implementar os 3Rs”, seja através de aconselhamento, seja pela oferta de formação em opções alternativas.


Substituir os animais: as alternativas num longo percurso

A União Europeia (UE) tem vindo a defender publicamente o fim das experiências com animais “tão rapidamente quanto for possível fazê-lo do ponto de vista científico”. Em 2023, reforçou a intenção de acelerar os processos de eliminação progressiva do uso de animais em laboratório, comprometendo-se com um forte apoio na procura de alternativas.

“Há certas perguntas para as quais estamos longe de ter alternativas não-animais. Acho que ninguém que trabalha na investigação está a ver o dia em que podemos responder a todas as perguntas sem recorrer a estudos com animais”, afirma Iolanda Moreira.
Os tratadores são a "linha da frente" dos cuidados aos animais, mas os investigadores são responsáveis pelos seus animais
Mafalda Gomes

A diretora do biotério de roedores do iMM sublinha que “toda a gente tem interesse na eliminação da utilização de animais para fins científicos” – mesmo ela própria, que é “responsável por um estabelecimento”. “As pessoas envolvidas em experimentação animal não são sádicas”, pelo contrário, têm, “até uma extensão que seja saudável”, de gostar de animais, “porque isto não se faz de outra maneira.”

No estudo do cancro, uma das principais áreas de investigação da Fundação Champalimaud, “é fácil saber muita coisa in vitro”, acrescenta a diretora do biotério. “Mas se queremos estudar as metástases, a interação do sistema imune com o sistema nervosos ou a interação do sistema imune no combate ao próprio tumor, a tecnologia deixa de dar essas respostas”, prossegue, sublinhando que há “ainda muito por saber sobre o cérebro”.

A tecnologia veio reduzir a utilização de animais em contexto de laboratório, mas a substituição ainda está longe de acontecer
Mafalda Gomes

As experiências em animais têm trazido avanços no tratamento de várias doenças: no cancro da mama, por exemplo, os índices de sobrevivência têm vindo a aumentar devido à utilização de animais em investigação. Os inaladores para asma, a insulina para diabéticos e a maior parte das vacinas teve também uma base experimental em animais. A maioria dos Prémio Nobel de Medicina e Fisiologia, atribuídos desde o século XX, foram para investigações que utilizaram animais – como está afixado num cartaz, na sala de trabalho do biotério da Champalimaud.

Há muita tecnologia que já reduz a utilização de animais”, garante Isabel Campos, apontando, como exemplo, para um aparelho designado IVIS – uma máquina que permite ao investigador acompanhar a evolução de um tumor sem que o animal tenha de ser eutanasiado.

A criopreservação de óvulos é outra tecnologia que evita a criação de animais sem necessidade, preservando as linhagens transgénicas que não estão a ser utilizadas. No iMM está também a ser testado uma alternativa técnica aos ratinhos sentinela – que ajudam no controlo sanitário das colónias.

Na Fundação Champalimaud, a criopreservação permite manter linhas transgénica sem desperdício
Mafalda Gomes

Nas experiências em si, o fim do uso de animais ainda não está à vista dos investigadores. Para Anna Olson, a razão prende-se com a “complexidade da natureza” que dificulta a criação de modelos capazes de a reproduzir. Reconhece, contudo, que já foram alcançadas vitórias nesse sentido, como a proibição do uso de animais para testes cosméticos, aprovada pela UE em 2013.

“Nesta área foi mais fácil substituir porque a administração é sempre tópica e a pele é uma estrutura relativamente simples e bidimensional. É fácil de reproduzir em cultura e em laboratório pele que não faz parte de um ser vivo”, explica a fundadora do 3RKC, ressaltando que esta área não é igual à da investigação de fármacos ou tratamentos. “A discussão pública tende a simplificar muito e a fazer grandes extrapolações.


A procura pela transparência

Na diretiva europeia, é também referida a obrigatoriedade de divulgação dos resumos não técnicos de todos os projetos aprovados, ou seja, documentos que permitem à população não especialista saber quais as experiências em curso e quais os procedimentos aplicados aos animais. Mas, mais uma vez, os institutos foram além do que é a legislação e os principais biotérios em Portugal decidiram assinar um acordo de transparência.

“A lei europeia foi revolucionária na forma como começou a abrir a porta para ser possível haver mais transparência em relação à experimentação animal”, explica Nuno Gonçalves, gestor de eventos e projetos da Associação Europeia de Investigação com Animais (EARA, na sigla inglesa). Mesmo assim, os acordos de transparência acrescentam um maior compromisso das instituições em comunicar o que se faz em laboratório com o público.
Se o animal vier a desenvolver alguma problemas de saúde as gaiolas são adaptações para promover o bem-estar
Mafalda Gomes

Neste acordo, os institutos comprometem-se a promover a transparência nos biotérios, através da criação de um site acessível e compreensível ao público em geral, promovendo também uma organização de comunicação sobre a temática da experimentação animal. O objetivo é que “o grande público perceba por que são utilizados animais em ciências biomédicas”.

“Se não dermos informação ao público, as únicas imagens que vão ver são divulgadas por ativistas, que normalmente são situações fora de contexto em que os animais estão, de facto, em mau estado. Se oferecermos imagens do dia a dia, se mostrarmos como são bem tratados e que o bem-estar é a prioridade número um dos tratadores e médicos veterinários do biotério, acho que passam a ter mais noção de como as coisas funcionam no instituto”, declara Nuno Gonçalves.

O iMM é um dos novos membros da EARA, uma organização não-governamental (ONG) que foi fundada em 2014 com o objetivo de promover a transparência na comunicação da ciência que recorre a animais de laboratório. O último relatório de avaliação ao acordo de transparência em Portugal sublinha um aumento do número de instituições a aderirem a esta iniciativa – que passou de 16 em 2018 para 25 em 2022.

A transparência na investigação com animais é um dos objetivos do iMM e da Fundação Champalimaud
Mafalda Gomes

Durante este ano, a maioria das instituições “interagiu com o público, comunicando regularmente sobre a forma como a investigação em animais é conduzida nas suas instalações ou sobre os resultados de investigações que exigiram a utilização de animais”, principalmente através das redes sociais.

“A maioria dos signatários (71%) partilhou imagens das instalações onde se encontram os animais e cerca de metade dos signatários (47%) partilhou imagens dos animais utilizados na investigação. Quase todos os signatários (94%) têm uma declaração de posição sobre investigação em animais disponível em seu site”, pode ler-se no resumo do relatório divulgado pela EARA. Por outro lado, a divulgação dos resumos não técnicos nos sites oficiais é um ponto a melhorar.

O gestor de eventos e projetos reconhece que existe “ainda algum medo quase ancestral de falar do assunto, algo que a EARA tenta “ativamente combater”. Até porque, é com informação que se combate a desinformação e se “equilibra” o palco neste assunto complexo e polémico.

Os cientistas eram muito pouco transparentes em relação ao que faziam e, nos anos 1990, isso levou a muita reivindicação por parte de grupos ativistas. Porque ninguém sabia o que os cientistas faziam, era tudo feito à porta fechada, apesar de ser regulamentado a nível europeu”, explica Nuno Gonçalves, sublinhando que, atualmente, a legislação europeia é a “melhor a nível mundial”.
No biotério do iMM, cada sala é identificada pelo nome de um ratinho famoso
Mafalda Gomes

Para continuar a promover a transparência, a EARA lançou um projeto que pretende aproximar os pacientes da investigação científica. Depois de uma primeira iniciativa nos Países Baixos, esta ONG realizou uma parceria com a Associação Protetora de Diabéticos Portugueses e a NOVA Medical School para explicar aos pacientes “que tipo de investigação é feita” sobre a doença. Com este projeto, a EARA pretende que os pacientes se tornem eles próprios “disseminadores de informação sobre o que é a investigação com recurso a animais”.

A iniciativa ainda está em preparação e poderá incluir encontros com investigadores e visitas a biotérios. Por isso, não esquecer: colocar a bata, o cobre-pés, a touca, as luvas e a máscara. E antes de entrar, dê uma borrifadela extra de spray desinfetante nas mãos, só para prevenir.

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