Grande Reportagem SIC

Inimputáveis: os primeiros dias de liberdade

Já foram libertadas 65 pessoas inimputáveis desde que a nova lei de saúde mental entrou em vigor, em agosto do ano passado. A direção dos serviços prisionais diz que não há, até ao momento, notícia de que algum tenha reincidido. A Grande Reportagem "Liberdade Condicionada" acompanha os primeiros dias de liberdade de três pessoas que um dia foram consideradas inimputáveis.

Loading...

Portugal foi pioneiro a terminar com a prisão prepétua, em 1884, mas manteve os internamentos ilimitados durante os seguintes 140 anos. Só no ano passado deixou de ser possível prolongar as medidas privativas de liberdade das pessoas inimputáveis, as “penas” dos que cometeram crimes sem culpa, sem consciência crítica do que fizeram. Os ilícitos imputados apenas à doença.

A lei de saúde mental de 2023 entende que não há exceções: nenhum cidadão - imputável ou inimputável - pode ser privado de liberdade com carácter ilimitado e indefinido. A 20 de agosto de 2023 foram libertadas 46 pessoas inimputáveis e, à medida que eram cumpridos os prazos de internamento, outros doentes foram saindo. Mas a liberdade que os espera fora do sistema prisional ou de uma enfermaria forense está condicionada. Condicionada pela doença, condicionada pela falta de retaguarda da família, muitas vezes ela própria vítima do doente, condicionada por ausência de resposta social, por atrasos na aplicação de verbas do PRR na área da saúde mental.

O condicionamento de Ezequiel Ribeiro, de 56 anos, tem sido a sua própria doença, psicose esquizofrénica na forma paranóide. A cada revisão de medida de segurança, o juiz de execução de penas entendia que o doente constituía um perigo para si próprio e para os outros, acabando por renovar os internamentos. O código penal permite-o. O futuro quase certo de doentes como Ezequiel seria aguardar pelo fim da vida numa enfermaria forense ou na ala dos inimputáveis, na cadeia de Santa Cruz do Bispo, onde esteve até dia 20 de agosto de 2023.

No caso de Cristiano Pinto, a deficiência cognitiva levou-o a um entra e sai do sistema prisional. Durante 30 anos conheceu várias medidas de segurança de cada vez que era condenado por autoria de incêndios florestais, na zona de Tábua, onde nasceu há 50 anos. É o que se costuma chamar na gíria forense, de “canário”. Cristiano esteve institucionalizado tanto tempo, sem retaguarda familiar, que a enfermaria ou a cadeia já são a única casa que conhece. A SIC entrevistou-o em 2018, na cadeia, e já nessa altura manifestava vontade de não mais sair dali. A lei acabou por lhe trocar as voltas. Foi libertado no mesmo dia de Ezequiel Ribeiro.

A Grande Reportagem Liberdade Condicionada seguiu os primeiros dias de liberdade de três pessoas consideradas inimputáveis e os obstáculos que as equipas do Centro de Responsabilidade Integrado do Hospital Sobral Cid, em Coimbra têm de ultrapassar.

  • Jornalista: Amélia Moura Ramos
  • Imagem: João Lúcio e Paulo Cepa
  • Edição: Marisabel Neto
  • Grafismo: João Leitão
  • Drone: 4KFLY
  • Colorista: Gonçalo Carvoeiras
  • Pós-produção áudio: Octaviano Rodrigues
  • Produção Editorial: Diana Matias
Últimas notícias
Mais Vistos
Mais Vistos do