País

Litoral Alentejano e Barlavento Algarvio com escassez de chuva há duas décadas

São neste momento nove as barragens abaixo da metade da capacidade, todas nesta zona do pais.

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O Litoral Alentejano e o Barlavento Algarvio enfrentam uma escassez de chuva que dura há duas décadas e que ameaça, por exemplo, deixar os agricultores de Lagos e de Alvor sem água para rega pelo segundo ano consecutivo.

Apesar do Inverno chuvoso ter reposto boa parte das reservas de água do país, 9 barragens do Sudoeste do continente continuam abaixo dos 50% da capacidade, 3 delas com pouco mais de 10%. É o caso da Barragem do Monte da Rocha, em Ourique, que está a 11%, da de Campilhas, em Santiago do Cacém, ainda a 13% e a da Bravura, Lagos, cuja albufeira com capacidade para 34 milhões de m3 de água, tem por esta altura pouco mais de 4 milhões (13%).

“Neste momento até temos menos um milhão de m3 do que tínhamos no ano passado no início do verão, portanto estamos aquém e muito preocupados com a pouca água que tem chovido aqui na zona do Barlavento Algarvio. No país inteiro tem chovido e aqui não chove, não sei porquê”, diz o presidente da Associação de Regantes de Alvor António Marreiros.

UMA DÉCADA DE CHUVA ABAIXO DA MÉDIA

Apesar de alguma recarga em dezembro (cerca de 1 milhão de m3), Janeiro não trouxe praticamente nenhuma água à albufeira. A estação meteorológica amadora do projeto Meteofontes, em Lagoa, “registou chuva residual na maior parte do mês", explica o meteorologista amador que lidera o projeto autárquico. Bruno Gonçalves, que vem compilando os dados da estação desde 2009, refere, aliás, “há 10 anos que chove abaixo da média” naquele ponto do barrocal algarvio.

A situação de seca ali, observa, "já se prolonga há vários anos", sendo que, "nos últimos 4. a situação ainda se agravou mais”. Os efeitos dessa escassez de chuva são visíveis nas Fontes de Estômbar, onde está localizada a estação meteorológica. Só há cascalho seco onde antes era uma zona de banhos. As fontes irrigadas pela maior reserva de água do Algarve, o aquífero Querença-Silves, secaram há quatro anos e nunca mais a caldeira do moinho voltou a ter água.

AS TEMPESTADES QUE PASSAM AO LADO

Bruno Gonçalves nota que “as situações que causam mais precipitação no Barlavento Algarvio, as chamadas depressões isoladas em altura que se formam a sudoeste de Sagres, têm sido menos frequentes”. A explicação para esse fenómeno, diz, pode estar no impacto das alterações climáticas.

Os dados do Instituto Português do Mar e da Atmosfera sugerem igual perspetiva. Não só registam que os últimos 20 anos trouxeram ainda menos água ao já de si menos chuvoso Sudoeste continental, como sugerem que os elementos meteorológicos que formam as tempestades vindas do Atlântico, entre elas as de Sudoeste, parecem estar a mudar de sítio.

Ricardo Deus, chefe da Divisão de Clima e Alterações Climáticas do IPMA, explica que têm sido detetadas essas novas configurações, “com centros de ação em diferentes sítios”, que podem fazer com que “a precipitação passe provavelmente menos vezes a Sul e mais a Norte”. Os indicadores, diz, “assim o apontam, mas é ainda difícil dizer que há uma tendência clara”.

O caráter extraordinário do rio atmosférico que atingiu Lisboa em dezembro está a ser encarado com um dos exemplos desse fenómeno. Em vez da tempestade ir gerando chuva desde o sudoeste do país em deslocação para norte, foi direta ao Vale do Tejo e ali foi chovendo ao longo de dias. Admitindo que o fenómeno ainda carece de maior estudo, o especialista do IPMA não tem dúvidas ao antever um futuro mais árido para o Sudoeste do país.

AGRICULTORES DESESPERAM

A Associação de Regantes de Alvor prefere manter a esperança de que março ou abril tragam ainda alguma chuva para garantir rega para as culturas sazonais. “ Em 64 anos, 2022 foi o primeiro ano que os agricultores não tiveram água. Se isto se repetir em 2023 não sei como vai ser o próximo verão. É muito preocupante”, confessa António Marreiros.

Seriam necessário 2 anos de pluviosidade média para abastecer a albufeira da Bravura. Mas, para já, a sobrevivência de 9 mil hectares de regadio e de 600 agricultores depende de que os céus devolvam à Barragem da Bravura cerca de 4 milhões de metros cúbicos de água.

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