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Pinto da Costa disparou e algemou-se

Opinião de João Rosado. As contas semifalhadas do presidente do FC Porto foram apenas um dos vários tiros dados nos pés desde o início da recandidatura.

Pinto da Costa disparou e algemou-se
DeFodi Images

É fruta da época, como se costuma dizer. Com o País colado à televisão a escrutinar todas as propostas dos programas eleitorais para as legislativas de 10 de março, é natural que um respeitável cidadão deixe escapar uma daquelas promessas que depois não consegue cumprir na íntegra.

Pode ter sido o caso de Jorge Nuno Pinto da Costa. Outrora habilitado na cena política, o líder máximo do FC Porto, na grande entrevista que deu à SIC em novembro último, estipulou três condições para se recandidatar e ontem ficou a saber-se que uma delas já não será completamente respeitada.

Em comunicado enviado à CMVM (Comissão do Mercado de Valores Mobiliários), a SAD portista reconheceu a existência de capitais próprios negativos de 8,5 milhões de euros referentes ao primeiro semestre da época 2023-24, o que contraria de forma substancial um dos pressupostos estabelecidos por Pinto da Costa (PC) para oficializar a corrida ao 16º mandato.

Além da qualificação para os oitavos de final da Liga dos Campeões (é já amanhã na Invicta que se realiza a primeira mão do confronto com o Arsenal) e do lançamento das bases para a nova Academia, o experimentado presidente tinha condicionado a ida a sufrágio à apresentação, por parte da SAD, de “capitais próprios positivos ou perto disso”.

Conforme se percebeu pelas palavras proferidas por PC esta segunda-feira na cerimónia de apresentação dos referidos resultados, o “perto disso” constitui agora a única tábua de salvação no discurso montado para o exterior em nome de uma coerência que pode dar pontos no campeonato da semântica, mas dificilmente terá reflexos na contagem dos votos.

Com André Villas-Boas à cabeça, os grandes rivais na disputa de abril não deixarão de tirar proveito das contas semifalhada do recordista de títulos a nível mundial e que ameaça bater o recorde de tiros nos pés desde que iniciou a aventura rumo ao ciclo governativo de 2024-2028.

Em primeiro lugar, Pinto da Costa não precisava de fazer nenhum tabu. Qualquer dirigente com décadas a fio no poder e um leque de conquistas que dava para encher dois museus perceberia que teriam sempre de ser os “outsiders” a dar todas as explicações aos associados.

Na qualidade de aclamado arquiteto da construção e reconhecimento do FC Porto como instituição de prestígio universal, Jorge Nuno só teria de se dar ao trabalho de pedir ao seu “staff” para recolher as assinaturas necessárias à formalização das intenções há muito denunciadas.

O facto de ter criado um mistério nacional que de... misterioso não teve nada acabou por reforçar os planos dos outros pretendentes, dando até a dispensável ideia de que apenas entrou em campanha porque acima de tudo não queria ver um antigo treinador sentar-se na cadeira mais alta.

PRETORIANO NO BRANCO

No fundo, logo de início, gerou-se o sentimento de que no quartel-general do senhor do Dragão a estratégia foi concebida em jeito de reação e atualmente nada que possa traduzir astuta jogada de antecipação é lançado para a agenda mediática.

De certeza mal habituado pela circunstância de nunca ter enfrentado uma oposição robusta, o “presidente dos presidentes” não reagiu com o tom nem o “timing” apropriados à noite nefasta de 13 de novembro (data da Assembleia Geral que acabou por sediar a “Operação Pretoriano”) e aos crimes cometidos junto da residência de Villas-Boas.

Como se isso não fosse suficiente, algemou-se a si mesmo às tais (três) condicionantes de recandidatura sabendo de antemão e muito melhor do que ninguém que uma delas era extraordinariamente difícil de executar na plenitude, contrastando com a que já estava no bolso (apuramento na Champions) e com a terraplanada em Gaia (terrenos da futura Academia).

O que levou Pinto da Costa a autolimitar-se em praça pública é ainda mais intrigante em função do que anunciou ontem (a entrada até final do mandato de um valor entre os 60 e os 70 milhões de euros fruto de acordo com parceiro internacional) e daquilo que constituía igualmente outros dos segredos expostos à vista de todos.

Sérgio Conceição nunca iria esconder-se atrás das cortinas e não era de facto preciso usar as vestes de São Tomé para crer no apoio do técnico ao amigo de uma vida.

Também isso PC conseguiu desperdiçar em poucos minutos, relembrando no Coliseu a amizade com Fernando Madureira, o chefe da claque “Super Dragões” que se encontra em regime de prisão preventiva.

Resta saber qual deles está mais aprisionado. Uns votarão no “Macaco”, outros colocarão uma cruz no homem que continua a fechar-se em promessas.

Se isto não é correr dentro de uma cela... andará perto disso.

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