Dois séculos depois da morte de Ludwig van Beethoven, a descoberta de substâncias tóxicas em mechas de cabelo do compositor alemão podem finalmente explicar o mistério sobre a sua surdez.
Um grupo de investigadores do Ira F. Brilliant Center for Beethoven Studies, da San Jose State University, encontrou quantidades “impressionantes” de chumbo nos fios de cabelo que terão pertencido ao compositor, como foi comprovado por uma análise de ADN.
Uma das mechas de Beethoven continha 258 microgramas de chumbo por grama de cabelo e outra tinha 380 microgramas por grama de cabelo, quando o nível normal desta substância no cabelo é inferior a quatro microgramas.
“Isto mostra definitivamente que Beethoven esteve exposto a concentrações elevadas de chumbo”, disse Paul Janetto, diretor do Mayo Clinic, laboratório especializado na análise de metais pesados, citado pelo ‘The New York Times’.
Segundo ainda Paul Janetto, os valores registados foram “dos mais elevados” que alguma vez observou em fios de cabelo. “Recebemos amostras de todo o mundo e estes valores são de uma magnitude superior”, garantiu.
Além de chumbo, os fios de cabelo de Beethoven continham também níveis de arsénio 13 vezes acima do normal e níveis de mercúrio quatro vezes superiores ao normal. Contudo, terá sido o chumbo o principal responsável por vários dos problemas de saúde do compositor, tais como a sua surdez, as cólicas abdominais, a flatulência e a diarreia.
"As grandes quantidades de chumbo, em particular, podem ter causado muitas das suas doenças", garantiu Jannetto.
O mais recente estudo vem atualizar as conclusões divulgadas em 2023 pela mesma equipa de cientistas, que na altura tinham afirmado que Beethoven não tinha sofrido envenenamento por chumbo.
Com os novos dados, os investigadores defendem agora que afinal o compositor tinha chumbo suficiente no corpo para explicar os seus problemas de saúde.
De acordo com David Eaton, toxicologista e professor emérito da Unversity of Washington que não participou no estudo, os problemas gastrointestinais do compositor “são completamente consistentes com o envenenamento por chumbo”. Tal como é possível que este metal tenha levado à sua perda de audição, uma vez que "altas doses de chumbo podem ter efeitos graves no sistema nervoso".
A nova investigação não põe como hipótese o envenenamento deliberado de Beethoven, no entanto chama à atenção para a omnipresença deste químico na vida quotidiana da Europa do século XIX, dos vinhos aos alimentos, passando por medicamentos e pomadas.
Jerome Nriagu, especialista em envenenamento por chumbo e professor emérito da University of Michigan, em entrevista ao ‘The New York Times’, afirmou que uma das fontes prováveis dos elevados níveis de chumbo de Beethoven era o vinho barato, uma vez que o chumbo, sob a forma de acetato de chumbo (substância também conhecida como “açúcar de chumbo”), era usado pelo compositor para tornar o vinho de má qualidade mais saboroso e agradável.
Segundo William Meredith, fundador e diretor do Ira F. Brilliant Center for Beethoven Studies, o compositor "consumia grandes quantidades de vinho, cerca de uma garrafa por dia, e mais tarde ainda mais, acreditando que era bom para a sua saúde".
De acordo ainda com Meredith, Beethoven era completamente viciado no álcool, sendo que nos últimos dias antes da sua morte, aos 56 anos em 1827, os seus amigos lhe deram vinho às colheradas acreditando que seria bom para o compositor, realidade documentada pelo seu secretário e biógrafo, Anton Schindler.
Ao longo da sua vida, Beethoven consultou inúmeros médicos, experimentou vários tratamentos para as suas doenças gastrointestinais e para a sua surdez e chegou a tomar 75 medicamentos, muitos dos quais provavelmente tinham chumbo, mas nunca conseguiu aliviar os seus problemas de saúde.