Há uma parte do nosso cérebro que responde de igual forma ao isolamento e à fome? Pode dizer-se que sim
Um estudo publicado na revista científica Nature Neuroscience concluiu que, depois de ficarmos em isolamento durante um determinado período de tempo, o desejo por interações sociais é, em termos neurológicos, muito semelhante à vontade de comer que sentimos depois de fazermos jejum.
Investigadores do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) e do Instituto Salk analisaram o cérebro de 40 voluntários saudáveis. Os voluntários, a maioria estudantes universitários, foram colocados em isolamento num espaço sem janelas durante 10 horas. Sem acesso a telemóveis, só podiam falar com os investigadores a partir de um computador que tinham na sala. Depois desse tempo, foi pedido que fizessem jejum de 24 horas no dia a seguir a terem estado em isolamento.
Enquanto os voluntários estiveram em isolamento, foram-lhes mostradas imagens de várias atividades sociais. Durante o período de jejum, mostraram imagens de comida, a preferida dos voluntários.
Através da ressonância magnética, os investigadores descobriram que a substância negra (uma parte do cérebro) respondia de forma muito semelhante em ambas as situações.
"Quando uma pessoa estava isolada, esta área do cérebro mostrava uma maior atividade em resposta a imagens de outras pessoas e não a imagens com comida. Quando alguém tinha feito jejum, a substância negra mostrou também uma maior atividade em resposta às imagens de comida e não com pessoas", disse Livia Tomova, investigadora no MIT na altura em que o estudo foi realizado.
Estes resultados podem sugerir que o nosso cérebro considera a interação social uma necessidade básica, tal como o nosso corpo precisa de comida para funcionar.
A pandemia, o isolamento e a saúde mental
A pandemia da covid-19 veio obrigar a população mundial a isolar-se e diminuir os contactos físicos com amigos e família. E é sabido que a pandemia interrompeu ou suspendeu serviços essenciais de saúde mental em 93% dos países do mundo, numa altura em que a procura por estes cuidados de saúde está a aumentar.
Os efeitos do isolamento e da doença de covid-19 na saúde mental têm sido alvo de diversos estudos. Vítor Cotovio, psiquiatra, alerta que a saúde mental tem um duplo risco. Se por um lado as pessoas com patologia psiquiátrica prévia têm maior probabilidade de adoecer de covid-19, por outro um quinto das pessoas que adoeceram podem ter perturbações psiquiátricas como depressão ou ansiedade.
“A pandemia faz acionar em nós o viver sob o sentimento de ameaça que se traduz num medo, que é uma resposta emocional à ameaça eminente de ficar infetado, ou então em ansiedade, que é a antecipação de uma ameaça futura – ou porque se perde o emprego, ou porque se tem medo de não ficar completamente recuperado, quer o próprio quer os seus”, explica o psiquiatra.