Saúde Mental

Perguntas & respostas sobre Saúde Mental

Dez respostas a perguntas que todos nós, volta e meia, vamos fazendo. É um pequeno guia, feito com a colaboração do psicólogo clínico e forense Mauro Paulino, para ajudar quem tem dúvidas sobre questões relacionadas com a saúde mental.

O sofrimento emocional é normal?

O sofrimento emocional é uma resposta natural e humana, que é desencadeada quando o ser humano sente que não tem ferramentas emocionais ou recursos para gerir uma determinada situação, sendo por isso subjetiva.

Enquanto vivência considerada normal, o sofrimento pode ser, quando gerido e enfrentado, importante para o próprio crescimento e desenvolvimento, o que implica alguma capacidade de introspeção. Quando exigido a uma pessoa que consiga gerir o seu sofrimento, são desenvolvidas ferramentas que podem ser aplicadas em inúmeros outros momentos da vida e face a diferentes problemáticas. Desta forma, o sofrimento também pode ser visto como protetor, um sistema de alarme para situações prejudiciais ao nosso bem-estar e que exigem o nosso afastamento.

Assim, ainda que configure uma reação normal, não é suposto que a pessoa viva constantemente em sofrimento, sendo tal tensão interior prejudicial ao bem-estar e saúde mental, se não for gerida em direção à mudança. É importante perceber que o sofrimento não significa que a Pessoa é fraca, mas apenas que é humana.

Contudo, em determinadas situações o sofrimento pode ser excessivo ou não existir estímulo real que o provoque, sendo tais casos patológicos

Como distinguir tristeza de depressão?

A tristeza é uma emoção primária considerada normal, quando adequada às circunstâncias que a provocam, em termos de intensidade e duração. É saudável que a pessoa sinta e expresse tristeza, perante um evento adverso.

Por sua vez, a depressão é uma perturbação do humor que integra uma tristeza tão intensa e prolongada no tempo que condiciona o funcionamento normal da pessoa em inúmeros domínios, como o social (por exemplo, recorrer ao isolamento), laboral (por exemplo, incapacidade de atenção e concentração no trabalho) e familiar (por exemplo, a degradação das relações devido à indisponibilidade emocional e cognitiva, mal-estar, sensação de distanciamento da pessoa em sofrimento). Daí a associação entre a depressão e o risco de suicídio, pois a pessoa vive um sofrimento tão intenso que é incapaz de ver alternativas para além de terminar com a própria vida para extinguir o seu sofrimento.

A depressão, enquanto perturbação do humor, envolve outros sintomas para além da tristeza, como por exemplo a sensação de vazio, perda do interesse e prazer em atividades que, anteriormente, eram fonte de bem-estar, perturbações na rotina do sono, fadiga, sentimentos de culpa, dificuldades de atenção e concentração e pensamentos recorrentes acerca da morte.

A depressão exige uma intervenção psicológica especializada, enquanto que a tristeza corresponde a uma reação emocional e humana ao que acontece à nossa volta.

É possível controlar a minha ansiedade?

Sim, a ansiedade, enquanto reação a um determinado estímulo stressor, é passível de ser controlada. Não raras vezes, a intervenção psicológica integra um trabalho de exploração dos pensamentos negativos que provocam ansiedade (por exemplo, “Não vou conseguir”, “Não valho nada”), desconstruindo a veracidade destes pensamentos e o seu impacto, assim como das emoções associadas, como por exemplo o medo (“Tenho medo de falhar”) e dos próprios sintomas, como a sensação de aperto no peito, respiração acelerada e tensão corporal, por exemplo com recurso a técnicas de relaxamento.

O psicólogo identifica, em colaboração mútua com a pessoa que vivencia ansiedade, ferramentas para a sua gestão, tendo em conta a origem e as suas particularidades.

Tive um ataque de pânico, vou voltar a ter?

O risco de um ataque de pânico ser seguido de outro tende a ser elevado. O próprio medo da pessoa de um novo ataque de pânico pode ser, por si só, facilitador do mesmo, pois a pessoa encontra-se sobressaltada e particularmente atenta a todos os sinais, os quais podem ser lidos de forma distorcida.

No entanto, com o recurso a consulta psicológica é possível trabalhar a ansiedade e os conflitos internos que estão na origem dos ataques de pânico e identificar estratégias de prevenção, por exemplo com recurso à identificação de alguns sinais ou situações de risco.

O psicólogo providencia assim estratégias para a gestão da ansiedade e promove o autoconhecimento da pessoa, sendo facilitada a redução da frequência dos ataques, até à sua extinção. Dependendo das particularidades do caso concreto, poderá justificar-se uma intervenção integrada da psicologia e psiquiatria.

Há casos de doença mental na minha família, corro riscos?

A existência de uma história de doença mental na família pode ser um fator de risco, mas isso não significa que exista uma relação direta, linear, inevitável e irreversível entre o historial familiar e a existência de doença mental. Os fatores genéticos são substanciais, mas não esmagadores.

A investigação revela que a forma como o histórico familiar se expressa é altamente regulado pelas experiências ao longo da vida, remetendo para a relevância dos aspetos ambientais da socialização e educação. Embora existam patologias com forte componente genética, o risco de desenvolver a doença, mesmo com familiares de primeiro grau atingidos, é relativo, dependendo de vários fatores externos, dos quais importa salientar o consumo de drogas e o trauma. Mesmo no caso de gémeos monozigóticos, que partilham os mesmos genes, a probabilidade de desenvolver uma doença mental como a esquizofrenia é de cerca de 50%. Assim, o crescimento e a organização do cérebro refletem a complexa interação entre as influências genéticas e ambientais.

Existem também fatores protetores que devem ser ponderados, designadamente uma boa rede de suporte social, a vinculação segura na infância, o recurso a ajuda psicológica e motivação para a mudança e estratégias adequadas para gerir as emoções associadas a eventos negativos. Naturalmente que se a pessoa é suscetível ao desenvolvimento de uma doença, o consumo de drogas ou eventos de vida particularmente stressantes como experiências abusivas na infância, exposição à violência ou perdas precoces elevam o risco de se desenvolver uma perturbação mental.

Qualquer pessoa pode sofrer de doença mental?

Dependendo das experiências vivenciadas, particularmente na infância, qualquer pessoa, pode, em abstrato, sofrer de doença mental. Sabemos hoje que existem fatores de risco para o desenvolvimento de perturbações mentais, para além da carga genética de algumas doenças, como referido anteriormente.

Destacam-se, por exemplo, o consumo de drogas e as experiências adversas na infância, por exemplo negligência emocional, abusos sexuais, um contexto familiar de violência, enquanto fatores de risco para perturbações como a depressão, as perturbações da personalidade, a esquizofrenia, entre outros.

Sucede também que experiências adversas na vida adulta, como perdas significativas e eventos traumáticos, ainda que com uma infância saudável, podem desencadear, em alguns casos, uma perturbação do humor, tendo em conta o impacto emocional subjetivamente sentido.

Preciso de ajuda, mas não sei como pedir. O que devo fazer?

Procurar agendar uma consulta com um psicólogo clínico e da saúde, visto ser o profissional que, pela sua formação, está habilitado a compreender e melhorar o funcionamento das pessoas, dos seus pensamentos, sentimentos e comportamentos.

Num ambiente de apoio seguro, confidencial e, por isso mesmo terapêutico, será possível conduzir uma intervenção psicológica eficaz através de um esforço colaborativo entre o profissional da psicologia e a pessoa.

O importante papel ativo da pessoa no pedido de ajuda pode ser direcionado em função das necessidades e especificidades das problemáticas que impedem o bem-estar.

A ajuda proporcionada por um psicólogo pode ocorrer em diferentes situações e necessidades, tais como lidar com experiências de vida ou sentimentos dolorosos que interferem com o funcionamento do dia-a-dia, construir uma boa autoestima, alterar características psicológicas, promover rendimentos de alto desempenho, resolver um luto complicado, ajudar as pessoas a preparem-se para uma cirurgia, gerir uma doença física que está a interferir com o bem-estar e intervir em perturbações da saúde mental, como a depressão, a ansiedade, as fobias, as perturbações alimentares, entre outras.

Qualquer cidadão, por diferentes motivos e em diferentes momentos da vida pode beneficiar de ajuda profissional de um psicólogo. Em Portugal, a inscrição na Ordem dos Psicólogos é uma condição legal necessária para o exercício da Psicologia, existindo um mecanismo de pesquisa que permite confirmar a inscrição na respetiva ordem.

Como sugerir que outra pessoa marque uma consulta com um profissional de saúde mental?

Num diálogo calmo, ponderado e descritivo, pode ser transmitido à pessoa as mudanças de comportamento notadas e o impacto sentido pelo próprio e outras pessoas que rodeiem a pessoa que poderá beneficiar de consulta psicológica.

Nesta sequência, poderá reforçar-se a necessidade de ajuda especializada para gerir as emoções vividas e que têm vindo a provocar alterações e/ou limitações no quotidiano.

Importa que em momento algum surjam juízos morais ou preconceitos que afastem a pessoa de aceitar ajuda especializada. É fundamental reforçar que pedir ajuda é um ato de coragem e não de fraqueza.

Por exemplo, para uma pessoa que evita dialogar sobre um assunto, pode ser benéfico reforçar esse aparente ganho (isto é, não estar em contacto com a dor) é inferior aos custos, nomeadamente a degradação das relações, a diminuição do bem-estar, o isolamento e o afetar da saúde mental.

O que posso fazer para melhorar a minha saúde mental?

Para melhorar a sua saúde mental é particularmente útil adotar estratégias e rotinas de autocuidado.

A título de exemplo, destaca-se recorrer a atividades prazerosas, como a leitura, o ouvir música, o exercício físico, que despoletam sensação de bem-estar, tranquilidade e conforto; ter um estilo de vida saudável, no que diz respeito a padrões de alimentação, sono e atividade física; desfrutar de uma rede de relações positivas, seja em contexto familiar, ou de amigos.

São também conhecidos os benefícios para a saúde física e mental de ter um animal de companhia, tais como redução dos fatores de risco cardiovasculares, uma maior tendência à implementação de mudanças e de um estilo de vida saudável, como fazer exercício físico, aumento do afeto positivo, dos níveis de relaxamento e da sensação de mindfulness.

Tenha-se ainda presente que, num registo preventivo e de promoção da saúde mental, a pessoa pode recorrer a um psicólogo para um processo de desenvolvimento pessoal, facilitador do autoconhecimento relativamente ao seu funcionamento e evolução.

Os medicamentos ajudam no tratamento das perturbações mentais?

Sim, os medicamentos podem ajudar em situações de doença mental, mas não podem ser encarados como uma panaceia que resolva qualquer problema.

Por exemplo, perante uma perturbação depressiva torna-se importante recorrer a ajuda psiquiátrica e, por sua vez, a terapêutica medicamentosa. Um dos papéis da medicação é ajudar na regulação neurológica e, por sua vez, possibilitar que a pessoa disponha de uma maior estabilidade cognitiva e emocional para a intervenção psicológica.

Os antidepressivos ao regularem a arquitetura do sono, mesmo os não sedativos, permitem à pessoa um padrão de sono mais reparador e, consequentemente, uma melhoria no humor e no funcionamento cognitivo, o que também poderá beneficiar a intervenção psicológica que possa ter lugar.

Salvaguarde-se que o efeito da ação dos psicofármacos não representa, num número significativo de casos, um tratamento de fundo da perturbação, para a qual poderá ser também importante beneficiar de intervenção psicológica. Por exemplo, a mera administração de ansiolíticos não resolve por si só o problema, na medida em que não soluciona as fontes de ansiedade ou de conflito, nem atua sobre os motivos ou as defesas da pessoa. Assim, qualquer uma destas intervenções - psicofarmacológica e psicológica - deve ser levada a cabo apenas por profissionais devidamente credenciados, uma vez que a abordagem terapêutica difere de situação para situação, devendo ser adaptada a cada individuo em concreto. Nenhuma delas se substitui, sendo que em alguns casos há benefícios na associação de ambas as intervenções.

Sucede também que a medicação, quando erradamente prescrita ou mantida, pode levar à manutenção da sintomatologia, sendo importante averiguar e trabalhar sobre a sua origem.

Ainda que comum, é altamente desaconselhada a recomendação ou troca de medicamentos entre vizinhos, amigos ou familiares, assim como a suspensão abrupta dos psicofármacos devido à ilusão de que já se está de perfeita saúde.

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