Desafios da Mente

Quando a ansiedade me paralisa

A ansiedade é inerente à condição humana. Quando a sua intensidade e duração levam a mudanças do comportamento, abre-se espaço para as perturbações de ansiedade.

Quando a ansiedade me paralisa
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A prevalência estimada das perturbações da ansiedade varia entre 3% a 30%. Apesar desta variação, os estudos são consistentes ao apontarem que se trata de uma das mais comuns perturbações mentais, têm um início precoce, assumem um caráter crónico e são incapacitantes, pelo que constituem um dos problemas de saúde mental mais grave da atualidade.

Em Portugal, estima-se uma prevalência anual de 16,5%. A prevalência mundial de qualquer perturbação da ansiedade em crianças e adolescentes é, segundo a Organização Mundial de Saúde, de 6,5%. São mais frequentes no sexo feminino, embora o rácio feminino: masculino seja igual nas crianças. A prevalência aumenta no sexo feminino na adolescência em 2: 1.

Como se caracteriza a ansiedade?

A ansiedade é um estado de tensão emocional frequentemente marcado por sintomas físicos como palpitações (sentir o próprio batimento do coração), hiperventilação (começar a respirar rapidamente), sudorese (produção excessiva de suor), tremores, hipotonia (diminuição do tónus) muscular, bem como por manifestações cognitivas, como apreensão, hipervigilância (manifestar excessiva atenção ao que o rodeia), inquietação, entre outras.

Estas manifestações constituem respostas temporárias, normativas e expectáveis em situações de tensão.

Podemos falar em perturbações de ansiedade quando as referidas manifestações ocorrem sem causa aparente, ou se a reação a essa causa é desproporcional; estão relacionadas com elevados níveis de sofrimento, ou com baixa capacidade de tolerância (intensidade); são recorrentes ou persistentes (duração); e, por fim, o comportamento é disfuncional, com prejuízo global do funcionamento.

O medo anda de mãos dadas com a ansiedade

O medo pode ser entendido como resposta emocional a uma ameaça iminente real ou percebida associada ao impulso de fugir ou lutar, não sendo, por si só, necessariamente um sinal de doença.

Comum aos animais e aos seres humanos, o medo corresponde a uma forma pessoal de ver o mundo, que se torna patológica quando o desencadeador não justifica a intensidade do sentimento, apresenta-se com demasiada frequência, prolonga-se no tempo e diminui a capacidade de a pessoa viver e de enfrentar uma situação.

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O resultado desse tipo de medo é um sentimento desagradável que causa mal-estar nos sistemas digestivo, respiratório, cardiovascular, provocando sensação de falta de controlo.

São diversas as perturbações mentais em que o medo está presente, às vezes, convivendo com a ansiedade. Por exemplo, as perturbações de ansiedade incluem, entre outros, as fobias específicas, explicadas como medo persistente de um objeto, atividade ou situação específica e desproporcional ao perigo real, resultando numa necessidade imperiosa de evitamento.

O medo pode estar, igualmente, presente, na perturbação obsessivo-compulsiva ou perturbações da alimentação e da ingestão.

E o que é uma fobia?

O termo refere-se a um tipo particular de medo inexplicável, irracional e persistente relativo a um determinado estímulo, considerado exagerado e que prejudica o funcionamento da pessoa, por se encontrar fora do controlo voluntário e conduzir ao evitamento da situação temida.

A exposição à situação temida pode provocar uma crise de ansiedade intensa, tomando, por vezes, a forma de ataque de pânico.

As fobias podem ter em conta estímulos externos como o medo de insetos, ratos, de espaços fechados (claustrofobia), medo das alturas (acrofobia), ou estímulos internos como o medo de doenças.

Inicialmente, a pessoa tem medo de uma determinada situação (por exemplo, alturas, espaços fechados ou andar de elevador) e, quando envolvida na situação, a pessoa fica com medo das consequências.

Quando o medo ou a fobia são ativados, a reação da pessoa pode ir desde a ansiedade ao pânico.

A grande característica diferenciadora de uma fobia é que envolve uma perceção elevada do risco numa determinada situação, quando, na verdade, esta é relativamente segura.

E um ataque de pânico?

O conceito de pânico diz respeito a um estado de elevada e intensa ansiedade associado a outros sintomas fisiológicos e cognitivos. Os sintomas fisiológicos do pânico são uma versão intensificada dos sintomas de ansiedade, com náuseas, transpiração intensa, entre outros. Adicionalmente, existe uma sensação de catástrofe iminente, sensação de inibição, desejo avassalador de sentir ou de obter ajuda.

Os ataques de pânico destacam-se entre as perturbações de ansiedade como um tipo particular de resposta ao medo e envolvem uma sensação de desamparo perante um perigo intenso e grave, mesmo não estando limitados às perturbações de ansiedade. Habitualmente, durante um ataque de pânico, as pessoas sentem que vão morrer e, após o episódio, surgem pensamentos intrusivos acerca da origem da sua origem que tendem a causar mal-estar e a provocar mais ansiedade, criando um ciclo de mal-estar.

O medo de reviver novamente esta experiência aterradora provoca um acentuar da ansiedade e, por sua vez, o risco de um novo ataque de pânico torna-se consecutivamente maior.

Uma história de ataques de pânico foi associada a mais ideação, planos e tentativas suicidas ao longo da vida, em comparação com aqueles que nunca tinham experimentado um ataque de pânico.

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Mas porque entro em pânico?

Existem vários modelos explicativos possíveis, mas para esta nossa breve reflexão diga-se que os ataques de pânico são mantidos por processos de atenção seletiva às sensações corporais, comportamentos de segurança, evitamento e generalização.

A atenção seletiva e hipervigilância para as sensações corporais levam-nos a prestar mais atenção ao nosso corpo, contribuindo, por exemplo, para um aumento da intensidade subjetiva da vivência dos eventos e da probabilidade de ativação do ciclo de pânico.

Assim, o medo de ter outro ataque e a hipervigilância alimentam a ansiedade antecipatória e os comportamentos de segurança. O evitamento das situações causadoras de ansiedade perpetua a ansiedade por restringir a exposição às situações temidas, reduzindo as oportunidades de reformular ou enfraquecer os nossos medos.

Podemos falar numa Perturbação de Pânico?

Sim, é possível falar na Perturbação de Pânico, uma das várias perturbações de ansiedade, quando uma pessoa experimenta ataques de pânico recorrentes e inesperados e está, frequentemente, preocupada com a possibilidade da ocorrência de novos ataques.

Neste âmbito, os ataques de pânico são repentinos, de elevada intensidade de medo ou desconforto, atingindo o pico em minutos, acompanhados de sintomas físicos e/ou cognitivos.

As pessoas com Perturbação de Pânico temem ataques recorrentes e exibem comportamentos de evitamento para garantir que não voltam a ocorrer.

Os ataques de pânico só acontecem durante o dia?

Algumas pessoas experienciam o pânico noturno, isto é, ataques de pânico que ocorrem durante o sono e compreendem os mesmos sintomas dos ataques de pânico que ocorrem durante estados de vigília (pânico diurno), resultando no despertar do sono.

Tal como os ataques de pânico diurnos, o pânico noturno ocorre sem desencadeadores óbvios, como os pesadelos. As pessoas têm frequentemente dificuldade em voltar a dormir após um ataque de pânico noturno e evitam dormir devido ao medo de novas ocorrências.

Aquelas que experimentam o pânico noturno são também mais propensas a relatar dormir menos de cinco horas por noite do que aquelas que experimentam apenas o pânico diurno. Ou seja, para pessoas que experimentam pânico noturno, a perda de sono e agitação extrema estão persistentemente presentes, criando um estado emocional facilitadora de uma tentativa de suicídio.

Assim, o pânico noturno representa a intersecção de dois fatores de risco de suicídio estabelecidos, nomeadamente os ataques de pânico e as perturbações do sono-vigília.

É neste contexto de sofrimento intenso que a perturbação de pânico, enquanto perturbação de ansiedade, está associada, de forma significativa, a pensamentos e comportamentos suicidas. Existe uma crescente evidência de que os estados de ansiedade aguda (por exemplo, aumento da excitação e agitação, ataques de pânico) estão presentes imediatamente antes das tentativas de suicídio.

E existem soluções?

A investigação demonstra os benefícios da intervenção psicológica em contexto de saúde, sendo eficaz no tratamento de uma panóplia de problemas que emergem ao longo do ciclo de vida. Para além do alívio do sofrimento que a perturbação acarreta, a intervenção psicológica minimiza um conjunto de consequências sociais e económicas.

Dependendo das características e necessidades do caso concreto, é selecionada a modalidade de tratamento, a qual pode integrar várias técnicas e/ou o complemento da psicofarmacologia. Tudo na procura de uma efetiva redução dos sintomas e desconforto vivenciado, mas também na promoção de um funcionamento diário marcado por sentimentos de bem-estar psicológico.

Recorde-se que como reconhecido por Miguel Guimarães, bastonário da Ordem dos Médicos, "a saúde mental vai ser a grande pandemia deste século" e se tivermos mais psicólogos não serão necessários medicamentos”.

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